A primeira infância

Introdução

A primeira infância é o período que vai desde a concepção até os 6 anos de idade. O desenvolvimento da primeira infância é a essência para o bem-estar e saúde na vida adulta, já que este é um período em que o cérebro se encontra em profundo desenvolvimento e que as primeiras relações estão sendo estabelecidas. Sabe-se através de estudos, que eventos ou experiências ocorridas na primeira infância podem ter repercussões duradouras na vida do indivíduo, envolvendo respostas comportamentais e físicas. Não apenas os determinantes biológicos, mas também os determinantes sociais estão fortemente relacionados ao desenvolvimento da primeira infância. A falta de acesso à saúde e nutrição adequada, a exposição ao estresse e a violência, podem ser extremamente prejudiciais ao desenvolvimento pleno e saudável de uma criança (1,2).

Fatores importantes

A condição neonatal e os fatores ambientais exercem uma grande influência sobre o desenvolvimento neuropsicomotor na infância. Os fatores de risco internos estão relacionados a questões biológicas (da gestação, parto, pós-parto) e genéticas, que interagem com o ambiente físico no qual a criança está inserida, bem como com os aspectos sociais, culturais e emocionais nos quais ela está integrada. Quando a criança apresenta esses fatores de risco biológicos, elas são mais vulneráveis a apresentarem comprometimento no desenvolvimento (2,3).

A nutrição adequada é um componente importantíssimo do desenvolvimento na primeira infância. Um estudo mostrou que crianças com diagnóstico de subnutrição nesta fase apresentavam uma diminuição nas habilidades de linguagem e prejuízo cognitivo, envolvendo a memória visuoespacial (4). Em outro estudo realizado no Brasil, foram avaliadas 30 crianças de 0 a 30 meses, com alguns fatores de risco para atrasos no desenvolvimento, como prematuridade, desnutrição moderada à grave e outros fatores neonatais de risco. O desenvolvimento das crianças foi avaliado através do Teste de Denver II e a qualidade e quantidade do estímulo que recebiam no ambiente domiciliar também foi avaliada através do questionário Home Observation for Measurement of the Environment (HOME), que envolve observação e entrevista com os pais ou responsáveis pela criança. Os pesquisadores identificaram que as crianças avaliadas apresentaram atraso no desenvolvimento, especialmente no domínio da linguagem. Esses atrasos foram associados à relação monoparental, à baixa escolaridade materna, intercorrências neonatais e receptividade dos pais. Por exemplo, foi observado que as crianças que tiveram um pior desempenho do Teste de Denver II também tinham menor disponibilidade de materiais para aprendizagem no domicílio (3).

O estímulo a movimentação e atividades físicas são importantes para o desenvolvimento motor da criança. O aumento da inatividade, da diminuição dos esforços físicos e motores, muitas vezes pela inserção cada vez mais cedo da criança no universo virtual, tem favorecido não só um aumento do sedentarismo e obesidade infantil, como também a perda de habilidade motoras fundamentais (5).

No entanto autores mostram que a brincadeira livre, por si só, não é o suficiente para o desenvolvimento de todo o potencial motor. Quando se trabalha com a criança intencionalmente, com estímulos diversificados de forma planejada e sistematizada, é favorecido o desenvolvimento de padrões maduros que vão sendo refinados no decurso do desenvolvimento. Um estudo conduzido em alunos de 4 a 5 anos observou a diferença entre um grupo que recebeu aulas de Educação Física tradicionais, com outro que recebeu aulas planejadas de acordo com objetivos de habilidade a serem desenvolvidas (locomotoras, manipulativas e estabilizadoras), com progressão do conteúdo de acordo com o desenvolvimento obtido pelos alunos. O que os pesquisadores identificaram foi que a própria existência da prática sistemática já é capaz de induzir melhorias no desempenho motor. Além disso, o grupo experimental teve uma melhora superior em algumas tarefas e que o quanto mais novos, mais sensíveis eram os alunos eram às intervenções. Concluindo, que as habilidades motoras não surgem espontaneamente, portando é necessário o estímulo com práticas organizadas, favorecendo assim o desenvolvimento pleno da criança (5).

A falta de condições para um desenvolvimento saudável, está relacionada a envolvimento com drogas, crime, desemprego e problemas de saúde futuros. Os estudos apontam que o investimento nesse período da vida da criança é mais vantajoso e eficaz do que tratar os problemas que podem surgir mais tarde. Além disso, é fundamental a participação ativa dos pais ou responsáveis em propiciar um ambiente tranquilo, seguro, acolhedor, com afeto, repleto de interações com adultos e estímulos sensoriais, motores, cognitivos e de linguagem para que essa criança cresça saudável, com bem-estar e que possa desenvolver todo o seu potencial até na vida adulta (1,2).

Referências

  1. Fundo das Nações Unidas para a Infância. UNICEF Brasil [Internet]. Desenvolvimento infantil. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/desenvolvimento-infantil
  2. Gonçalves TR, Duku E, Janus M. Developmental health in the context of an early childhood program in Brazil: the “Primeira Infância Melhor” experience. Cad Saúde Pública. 2019;35(3):e00224317. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00224317
  3. Zago JT de C, Pinto PAF, Leite HR, Santos JN, Morais RL de S. Associação entre o desenvolvimento neuropsicomotor e fatores de risco biológico e ambientais em crianças na primeira infância. Rev CEFAC. 2017;19(3):320–9. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1982-0216201719314416
  4. Alpes MF, Mishima F, Zuanetti PA, Fukuda MH. Linguagem oral, processamento fonológico e memória visuoespacial em crianças com histórico de subnutrição leve na primeira infância. Audiol, Commun Res. 2022;27:e2653. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2317-6431-2022-2653pt
  5. Silva SA da, Silva CM da, Velten MC. Influência de conteúdos sistematizados da educação física na coordenação motora de crianças na primeira infância. Motri. 2021;17(1):23-33. Disponível em: https://doi.org/10.6063/motricidade.20098

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